A recente decisão que definiu a Justiça Eleitoral foro competente para julgar os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro (crimes comuns) conexos aos delitos eleitorais (caixa dois ocorridos durante as campanhas eleitorais) possivelmente resultará em um resfriamento dos Programas de Integridade (ou Programas de Compliance) nas empresas no Brasil.

Isso porque – sem analisar qualquer mérito da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 14/03/2019 – existe uma expectativa de que a Justiça Eleitoral (composta em sua maioria por Juízes convocados integrantes da Justiça Estadual) atue nesses processos com menor rigor que a Justiça Federal, resultando num possível abrandamento nas decisões e penalidades em comparação com o que vem ocorrendo desde 2009, além da altamente inevitável morosidade, decorrente da curva de aprendizagem para análise de casos complexos de corrupção.

Principalmente nos últimos cinco anos, é notório que a atuação da Justiça Federal garantiu a excelência de resultados de combate a corrupção tendo, inclusive, aprimorado seus procedimentos, bem como sua análise de documentos e informações.

A certeza de punição à corrupção acarretou uma verdadeira corrida contra o relógio, em busca do aprimoramento dos Programas de Integridade das empresas ou até mesmo a implementação de Programas em empresas que duvidavam da real eficácia da Lei de AntiCorrupção (ou Lei da Empresa limpa). E muito mais: ajudou na mudança de cultura dessas empresas, fazendo com que os Programas de Integridade ganhassem a aderência das pessoas envolvidas na atividade da empresa.

Essa aderência é algo muito maior que uma simples aceitação ou participação. É acreditar, conduzir-se, fazer, responsabilizar-se por um ato, do qual o resultado pode não ser percebido de forma imediata ou objetiva. Quase um ato de fé. Por que você recicla o seu lixo, se não vê o resultado da usina de reciclagem? Porque você acredita que sua ação (por menor que seja) proporciona a redução do lixo, beneficiando a todos no longo prazo.

Sendo certo que a aderência dos Programas de Integridade também advém de esforços internos da empresa – com o comprometimento da alta administração (participando das decisões, dos treinamentos e das comunicações); a existência de canal de denúncias e investigações com sigilo e garantia de não retaliação; treinamentos e comunicação e etc. – deixar de contar com a força das decisões da Justiça Federal no combate à corrupção proporcionará um resfriamento dos Programas de Integridade das empresas, em decorrência da desmotivação à aderência por parte dos seus stakeholders.

As equipes de Compliance das empresas, que hoje já trabalham em tantas frentes diversificadas para implementação e/ou aprimoramento dos Programas de Integridade, terão que investir ainda mais esforços para convencer a todos da necessidade de manutenção de um ambiente livre das mazelas da corrupção. Esforços tais como o apoio de especialistas externos, comunicação positiva, treinamentos periódicos à públicos direcionados e treinamentos gamificados com apoio de novas tecnologias.

Para que a integridade corporativa continue a prosperar nas empresas e na sociedade, espera-se que a Justiça Eleitoral desenvolva seu papel com excelência, confiando que, em tempos de colaboração, a Justiça Federal possa transferir o conhecimento desenvolvido com tanto esforço ao longo dos últimos anos.

Publicado pelo Migalhas em 28/03/2019 – Migalhas